O Pacto do Barril
Minha admiração por Arthur Antunes Coimbra, o Zico, o Galinho deQuintino, o Camisa Dez da Gávea, não tem tamanho. E isso não é figurade linguagem. Se há alguém que mereça nesse mundo minha gratidão é o grande craque rubro-negro. Se há homem que faça jus ao meu respeito é o filho do seu Antunes. Agora mesmo, acabo de ouvi-lo num programa fantástico, o Encontros para a história, que promoveu a reunião do craque com o mestre Ruy Castro e um time bom de jornalistas carregando o piano. Declarou o Galo, dentre outras coisas, que não seria técnico da seleção brasileira até 2015, porque não confia "naquela gente" que comanda aCBF. É isso. Mas o mais bacana do programa e que tem a ver com o espaço aqui foiuma história que eu, rubro-negro de quatro costados, orgulhoso e feliz até o cú fazer bico de torcer por esse fenômeno de massas que é o Mais Querido, não conhecia: a do Pacto do Barril. Zico lembrou a decisão do segundo turno do Carioca de 1977, quando o Flamengo, que já tinha o lendário meio-campo Carpegiani, Adílio e Zico, e, como técnico, o aplicado Cláudio Coutinho, perdeu, nos pênaltis, o turno e o título para o Bacalhau. Milton Queiroz da Paixão, o Tita, entrara no final, justamente para bater um dos pênaltis.Perdeu o quinto da série, muito bem defendido pelo figuraçaMazaroppi. A seguir, Roberto confirmou a vitória cruz-maltina.
Contou Zico que os jogadores rubro-negros, após a decisão, resolveram se juntar em torno de Tita, então um jovem e promissor meia da Gávea,lapidado aos poucos para um dia ser o sucessor do Galo. Para dar uma força ao habilidoso jogador – que, depois, também defenderia as cores do bacalhau – os futuros gloriosos craques rubro-negros se reuniram no Barril 1800, no Arpoador. Lá, eles conversaram durante toda a noite e, lá pelo décimo chopp,chegaram a uma conclusão: eles formavam o melhor grupo de jogadores do país e não podiam pensar em outra coisa a não ser ganhar tudo o que jogassem.
Naquele momento, do grupo de craques que o Flamengo fez em casa,surgiu a fase das glórias rubro-negras. Daí em diante, foram o tri-campeonato carioca, os títulos brasileiros de 1980 e 1982, a epopéiada Libertadores e, claro, a conquista do mundo, o título no Japão,enfiando três pepinos no Liverpool (um de Adílio e dois de Nunes).Tita seria campeão nada menos que 18 vezes vestindo o Manto, até1985. Agora, vejam os senhores o poder de uma mesa de bar. Foi ali, diante do mar de Ipanema e da tulipa dourada, que um grupo distinto dejogadores e homens se tornou um grupo, uma instituição, uma entidade inconsútil, capaz de feitos míticos.Como nas missas, em que o Sagrado é representado pelo fruto fermentado da vinha, ali naquele boteco o Mágico fez-se encarnado nomalte contido naquelas tulipas em torno das quais corações, mentes e chuteiras se uniram num brinde pactual, em solene e carioquíssima cerimônia.E, a partir daquele gesto de união de corações em torno docompanheiro mais jovem, Tita, num momento de desdita, nasceria aVitória. Eu, garoto de dez anos que chorava a derrota naquele momento tomando um guaraná caçula no Seu Aníbal, sem ainda sequer desconfiardos poderes sagrados da fermentação e da destilaria, mal sabia das alegrias que uma rodada de chopp já estava me dando naquele exato momento.
Em tempo: aqueles jogadores estabeleceram outro cânone. NelsonRodrigues dizia que o torcedor rubro-negro toma a derrota como uma punhalada, uma traição. Aquela geração de jogadores levou esse sentimento para campo e a partir de então, para o Flamengo, só a vitória se tornou resultado aceitável. E é por isso que estendemos uma faixa para lembrar aos jogadores atuais uma verdade sem direito a sofismas: Campeonato Brasileiro é obrigação!!!
Tremei, torcidas rivais! Da desdita, nascerá, a partir dos nossosbrindes e nossa união, a Glória!
Dirley Fernandes
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